"O trabalho
afasta de nós três grandes males:
o tédio, o vício e a necessidade."
o tédio, o vício e a necessidade."
Angela
era ainda bem nova, quando foi levada a algumas clínicas ou escolinhas.
Logo descobrimos que existe todo um sistema sutil, ávido e ganancioso,
montado visando a exploração inescrupulosa da deficiência como meio
de faturar às custas do sofrimento. São os leiloeiros da miséria
alheia. O fato de essas crianças serem indefesas, não poderem falar
ou reclamar, propicia sobremodo o embuste, a que todos somos sujeitos,
na ávida e gananciosa sociedade moderna.
Numa
das clínicas, Angela tinha 3 horas diárias de trabalho, à tarde:
fonoaudiologia, a.v.d. e psicomotricidade. Numa dessas tardes, Sonia
ficou livre às 15 horas e pensou: porque ir para casa, se logo terei
que voltar para buscá-la? Comprou uma revista e estacionou o carro
quase em frente à clínica, onde ficou lendo. Pouco depois observa
que a terapeuta chega à janela, em companhia de Angela. Passa-se
o tempo, e a situação não muda. A terapeuta fuma cigarro após cigarro,
enquanto Angela olha para o nada. Estranha terapia, que se prolongou
por 45 minutos. Como seria o restante?
Durante
as nossas reuniões, ouve-se casos. Fernando tem 8 anos e sua mãe
o leva diariamente para ser atendido pela psicóloga. O pai é empresário,
e não regateia o alto preço. Um dia, no impedimento da mãe, é ele
quem o leva. A criança entra para o consultório, e a porta se fecha.
Algum tempo depois Francisco Bernardes fica sem cigarros e resolve
sair para comprá-los. Decide, porém, avisar a terapeuta. Abre a
porta, que estava destrancada, e se depara com um estranha cena:
a psicóloga tranqüilamente almoça, enquanto a criança observa, sentada
num sofá. Terapia?
Um
outro problema com que nos defrontamos é a crença, predominante
em nossa cultura, na causa psicológica das doenças mentais. Em consequência
a orientação dos trabalhos terapêuticos é bastante marcada pela
influência da psicanálise. Reportemo-nos aos trabalhos de Levitt:
"conclusão inevitável é que os estudos de avaliação disponíveis
não fornecem base razoável para a hipótese de que a psicoterapia
facilite a recuperação de doenças emocionais em crianças."
Outra
não poderia ser a interpretação da psicóloga Janet Brown, do Centro
Putman para crianças, em Boston, que adotava a linha psicanalítica,
no qual compara resultados de psicoterapia: "É algo surpreendente
que não existam diferenças significativas entre grupos, sejam quais
forem as variáveis consideradas - a idade das crianças, o tempo
de tratamento, a experiência dos terapeutas, o trabalho da mãe,
o tratamento do pai - nada faz diferença".
O
Autista é um ser isolado, que vive no seu mundo interior, tem dificuldades
de se comunicar. Existe, indubitavelmente, uma falha no sistema
cognitivo destas crianças, que faz com que o cérebro não tome conhecimento
perfeito do que os seus órgãos do sentido captam. O primeiro passo
é desenvolver este sistema cognitivo, estabelecer um canal de comunicação,
abrir um elo entre o seu universo fechado e o exterior.
As
chances de uma criança autista estabelecer uma boa comunicação com
o mundo exterior dependem diretamente da idade em que é feito o
diagnóstico e se inicie o trabalho, e da habilidade e dedicação
do terapeuta. A intervenção deve ser precoce, pois hoje é sabido
que o cérebro é particularmente maleável à aquisição de aptidões
de comunicação durante os primeiros anos de vida. É entre um e cinco
anos que o sistema cognitivo, com sua rede de neurônios cerebrais,
se desenvolve mais aceleradamente. A comunicação deve se iniciar
com imagens, gestos, sinais, palavras e bastante explorado o contato
físico, que recebe muita ênfase na terapia do abraço (holding therapy).
Existem
grandes polêmicas sobre as diversas opções terapêuticas para o autismo.
É natural que as famílias e os terapeutas procurem a abordagem que
lhes pareça mais promissora, ao sabor de suas inclinações, crenças
ou interesses pessoais. Porém, diante de um problema tão angustiante,
é necessário que aqueles que estão envolvidos com crianças autistas
não se deixem impressionar por soluções milagrosas ou estapafúrdias
e procurem encontrar uma solução de compromisso entre a desconfiança
excessiva e a aceitação passiva, na busca de uma abordagem adequada.
Tarefa que não é fácil, uma vez que muitas das opções não estão
descritas ou avaliadas convenientemente na literatura disponível
e existem muitas controvérsias a respeito. Situação que é bastante
complicada pelo desespero dos pais, na busca de uma cura miraculosa.
Até
o presente momento, nenhum das propostas terapêuticas existentes
provou ser capaz de curar o autismo, um distúrbio intrigante que
continua a desafiar a ciência médica. Mas tem sido possível uma
considerável redução da sintomatologia e uma melhora no comportamento,
facilitando a vida da família e a integração dos pacientes na sociedade.
É fundamental que a abordagem não fique limitada a apenas um único
processo terapêutico, mas que sejam usados diversos recursos alternativos,
de forma complementar.
A
Terapia Pedagógica ou educativa deve ser encarada como uma primeira
opção. Uma série de avaliações práticas evidenciaram que as crianças
autistas não conseguem estruturar o mundo de uma forma adequada,
e daí ser necessário lhes transmitir essa estruturação por pequenas
etapas, num quadro de um programa educativo compensatório, que poderíamos
designar de psicopedagogia interdisciplinar. Os únicos questionamentos
se limitam, de um modo geral, às divergências nas técnicas e na
aplicação.
A
abordagem pedagógica depende muito do pragmatismo, espírito de criatividade,
experiência e bom senso do educador, e deve ser complementada com
o auxílio de recursos diversos como imagens, desenhos, pinturas,
música, jogos, brinquedos especiais, atividades artísticas, manipulação
com massas e, ultimamente, até trabalhos com computador. O importante
é estimular a criança, dar-lhe atividades, tanto físicas quanto
mentais, e não deixa-la se isolar e se afundar nas estereotipias,
que acabarão por domina-la, atrofiando ainda mais o seu sistema
cognitivo, caso não haja uma estimulação permanente. As principais
técnicas educacionais são o condicionamento ou terapia comportamental,
e o método TEACCH, que vem se expandindo com relativo sucesso, nestas
últimas décadas.
Uma
segunda alternativa, que tem muitos defensores, é a dos suplementos
nutricionais. Há anos, que adeptos da medicina ortomolecular os
vêm prescrevendo, com especial ênfase nas vitaminas, como um meio
poderoso de manter e recompor a saúde. O uso de vitaminas, porém,
deve ser controlado porque existe o risco de intoxicação com doses
muito elevadas de certas vitaminas.
Para
o caso específico de autismo, tem sido muito apregoada, pelo Dr.
Rimland, do Instituto de Pesquisa de Autismo (USA) a Nuthera e o
DMG. A Nuthera é um complexo vitamínico, com base em altas doses
de vitamina B-6 e Magnésio. Seu uso deve ser considerado e não há
razão para ser evitá-lo, uma vez que a vitamina B6 está relacionada
com a formação dos neurotransmissores. Os pais devem procurar, experimentalmente,
a melhor dosagem, através de tentativas. É interessante recorrer
a um avaliador "cego", como tal um terapeuta que tenha
contato com a criança mas não tenha conhecimento da administração
da fórmula, para conseguir uma avaliação descompromissada e sem
influências.
Na
prática, se constatou que os pais não se mostraram muito persistentes
na aplicação da Nuthera. Mas a Mega Vitamina, como também é conhecida,
apresentou excelentes resultados na redução da hiperatividade e
dos problemas de sono de Angela. Contudo, em muitas outras crianças,
que também a ela recorreram, não se notou nenhum efeito apreciável.
Com
o DMG (dimetilglicina), os resultados foram ainda menos encorajadores,
embora relatórios do Instituto de Pesquisa de Autismo divulguem
relatórios entusiasmados. Porém inexistem estudos comprobatórios
e, como resposta de correspondência dirigida aos fabricantes, indagando
sobre dados da aplicação na terapia do autismo, recebemos apenas
listas de preço e anúncio de outros preparados.
A
medicação é um outro recurso, frequentemente usado. Sem dúvida,
é necessária para colocar alguns paciente sob controle, diante de
alguns sintomas mais graves, principalmente em casos de agressividade
ou convulsões. Porém acredito que existe uma tendência a abusar
de certas drogas neurolépticas, cujos efeitos colaterais sempre
são terríveis e nunca contribuem para uma melhoria efetiva, além
de poderem provocar dependência. O efeito pode ser contraditório
e até paradoxal, variando de paciente para paciente, pois nem todos
respondem da mesma forma. É um recurso muito usado em clínicas ou
internatos, para que o paciente não dê muito trabalho. As drogas
apenas dopam o paciente e o tornam mais controlável, enquanto perdura
o seu efeito. Na minha opinião e como resultado da minha experiência,
deve-se evitar o seu uso pois os efeitos colaterais são desastrosos.
Muitas destas drogas provocam, de imediato, uma amenorreia, que
pode se prolongar por vários meses, após a suspensão do medicamento.
Desencadeia, portanto, um distúrbio hormonal. Um dos medicamentos
recomendados por Temple Gradin, uma autista de alto nível intelectual,
portadora de Síndrome de Asperger, é o Tofranil, indicado para alguns
casos de depressão e agressividade. Reporta ela que aliviava a sua
tensão. Contudo, sua bula já assusta, pois revela que provoca baixa
plaquetária no sangue, sonolência, fadiga, inquietação, confusão,
delírios, desorientação, alucinações, ansiedade, agitação, vertigens,
sedação, etc. Este medicamento foi aplicado em Angela, a nossa revelia,
sob prescrição de um neurologista. A consequência foi ela, depois
de alguns meses, sofrer reações tão violentas e graves que exigiu
internação num CTI. Convém, portanto, ter toda a cautela, na administração
de quaisquer destas drogas e usá-las, se necessário, em doses mínimas.
Um
medicamento que tem sido muito apregoado, para reduzir a auto-agressividade
e o isolamento é o Naltrexone (Anne Walters - Journal of Autism
nº 2 Vol. 20), que bloqueia os opiáceos que são produzidos pelo
organismo. Há diversas teorias sobre a participação dos níveis inadequados
de opiáceos, no autismo.
A
cada dia surgem novas descoberta. A mais recente, publicada no Brown
University Child and Adolescent Psychopharmacology Update em setembro
de 1999, relata que Famotidine, um pepcídio usado para tratar úlceras
pépticas, provocou melhoras em pacientes autistas. Um estudo da
Dra. Linda A. Linday, em nove pacientes autistas entre 4 e 9 anos,
apresentado no Encontro anual da Associação Americana de Psiquiatria,
revelou que quatro dos jovens (44%) apresentaram melhoras com este
tratamento. Uma amostragem muito reduzida, para permitir conclusões
seguras.
Ultimamente
surgiram também muitas expectativas com o uso de Secretin, um hormônio
polipeptídio, envolvido no controle da função gástrica. Segundo
os proponentes da teoria do autismo como decorrência de excesso
de opiáceos no cérebro, o Secretin provocaria reações que neutralizariam
este efeito.
Uma
outra forma proposta para diminuir os problemas potenciais causados
por estes peptídeos prejudiciais, seria a dieta. A intervenção dietética
tem sido muito recomendada, ultimamente, não só para autistas mas,
de um modo geral, para todos, independente de idade e situação.
Diversos estudos realizados têm demonstrado a estreita relação entre
a alimentação e a saúde. Do que tem resultado uma verdadeira corrida
aos ditos "alimentos naturais" e sem agrotóxicos.
Atualmente
ninguém ignora que alimentos ricos em gorduras saturadas é responsável,
em grande parte, por males cardíacos e coronarianos. E quanto ao
cérebro? Muitas pessoas são alérgicas a determinados tipos de alimentos,
que poderiam afetá-las, mentalmente. Isto é indiscutível em pacientes
com fenilcetonúria, um distúrbio metabólico diante do qual uma dieta
adequada, desde tenra idade, possibilita evitar a instalação de
distúrbios mentais. Conservantes, empregados em alimentos industrializados,
têm sido apontados como responsáveis pela hiperatividade. Um dos
alimentos que tem sido muito criticado é o leite de vaca, cujo consumo
é condenado por diversos nutricionistas. Existem diversos estudos
sobre a intolerância a vários alimentos e produtos químicos, que
são apontados, em muitos casos, como responsáveis por provocar ou
agravar distúrbios de comportamento.
De
um lado existe o forte efeito da propaganda que, na busca de lucro
fácil, sempre atropelando as boas intenções, nos pressiona a consumir
alimentos inadequados ou até prejudiciais. Do outro lado, tem surgido,
nestes últimos anos, uma forte reação da sociedade, que resultou
na criação de diversas organizações mundiais dedicadas a discutir
este tipo problema. Destas poderíamos citar, nos EUA, a Feingold
Association, a Analytic Research Labs (Phoenix), e a Practical Allergy
Research Foundation (Buffalo). Todas elas dispõem de considerável
literatura sobre os desequilíbrios nutricionais, porém nenhum relativo
ao autismo.
A
Integração Sensorial é um recurso que tem sido bem aceito e considerado
como extremamente útil em alguns casos, como uma terapia complementar,
uma vez que o autista, de uma forma geral, apresenta uma reação
sensorial bastante anômala. Embora inexistam regras fixas para se
realizar essa tarefa, pois cada criança responderá de forma individual,
são bem conhecidas técnicas de abordagem que produzem resultados,
como as indicadas por Tansley no seu livro Treinamento e Percepção.
Segundo seu trabalho, direcionado para a criança deficiente, é importante
o desenvolvimento do esquema corporal, em que a criança deve tomar
consciência tátil e visual do seu corpo. Devem ser feitos exercícios
visando estimular o tato e os demais órgãos do sentido. Temple Gradin
defende a sua aplicação e até desenvolveu uma máquina que denominou
"Squeeze Machine", como uma forma mecânica de estimulação
tátil, que descreveu em seus trabalhos.
A
Terapia do Abraço (holding therapy) é realizada envolvendo o paciente
em abraços forçados que, teoricamente, passariam pelas fases de
aceitar, resistir e aquiescer. O objetivo é forçar um contato corporal
até torná-lo aceitável, de forma a vencer a tendência natural do
autista ao isolamento. A Sra. Gerlach, autora do Autism Treatment
Guide, supõe que a "holding therapy" possa representar
uma versão um tanto exagerada da Integração Sensorial. Este é um
recurso que pode apresentar alguns benefícios e para o qual não
existe nenhuma restrição, sob o ponto de vista terapêutico. Muito
ao contrário, pesquisas atuais demonstram que o contato físico entre
o bebê e sua mãe, pode ter efeitos profundos, não só psicológicos
mas principalmente fisiológicos. A Dra. Tiffany M. Field, pediatra
e psiquiatra da Universidade de Medicina de Miami verificou que
bebês que recebem 3 ou mais períodos de 15 minutos diários de contatos
e carícias, inclusive crescem mais dos que os que não recebem. Estudos
feitos com ratinhos mostraram que as taxas hormonais ficam abaixo
do normal, quando eles são afastados de suas mães.
A
terapia do abraço, aliás, tem sido usada, pelos psicanalistas, como
um pretexto para justificar a teoria psicogênica, da qual muitos
deles não desistem. Alegam, tentando explicar a mecânica deste processo,
que o relacionamento com a criança autista não se estabelece devido
à reciprocidade social, pois ela se isolaria num processo defensivo
diante da constatação de ser rejeitada. Esta é uma mera especulação
que não deve ser considerada.
Um
outro caminho que deve ser olhado com respeito, embora mais indicado
para crianças com problemas motores, é o indicado por Doman e trazido
para o Brasil pelo Dr. Veras, já falecido, e aplicado na Clínica
N.Sra. da Glória, no Rio.
Não
deve ser esquecida a importância das atividades físicas, na nossa
saúde física e mental. O efeito dos exercícios sobre o corpo e a
mente são conhecidos desde a antiguidade, sob o lema "Mens
Sana in Corpore Sano". Pesquisas realizadas com pessoas autistas
mostraram que vigorosos exercícios físicos podem diminuir as estereotipias
e comportamentos perturbados (McGimsey & Favell, 1988; Walters
& Walters, 1980).São altamente recomendáveis caminhadas, jogos
e, principalmente, natação pois a criança autista tem uma enorme
atração pela água. Muitos estudos já demonstraram que a atividade
física reduz a depressão e a ansiedade, acalma e relaxa. É sabido
que estimula o metabolismo orgânico e mental de todos, sejam normais
ou deficientes. Em especial, reduzem as estereotipias e retiram
o autista do seu isolamento num mundo a parte, obrigando-o a prestar
atenção no que está fazendo. Este princípio, criado e desenvolvido
pela Dra. Kitahara foi, aliás, adotado com bastante sucesso pela
Escola Higashi, no Japão, tão famosa pelos excelentes resultados
obtidos, que muitas famílias americanas levarem seus filhos para
lá. É interessante se observar que a Dra. Kitahara era advogada,
e não uma especialista da área.
Como
recursos terapêuticos complementares de grande importância, não
poderia deixar de citar a musicoterapia. A música, cujo efeito sobre
a mente é inegável, e é muito empregada em técnicas de relaxamento,
apresenta a vantagem de ser muito apreciada pelos autistas. É importante
citar que se conhece alguns casos de pacientes desta síndrome que
revelaram uma surpreendente aptidão musical, e aprenderam até mesmo
a tocar piano sem nunca terem recebido aulas. Um destes casos, bastante
documentado, é de um jovem que não se comunica, mas é capaz de reproduzir
qualquer música que ouça uma única vez. Ninguém conseguiu encontrar
uma explicação para tal feito.
É
muito importante destacar que o trabalho terapêutico não deve ser
feito em regime ambulatorial, como muitos insistem, porque exige
uma equipe multidisciplinar integrada e atuante, que estimule a
criança de uma forma intensa e continuada, durante várias horas
por dia. É indispensável que o ambiente seja bastante organizado
e bem estruturado. O ideal é que se disponha de amplas áreas verdes
e seja proporcionado o contato com pequenos animais. Um cão de pequeno
tamanho, de uma raça brincalhona como o poodle, por exemplo, e que
seja criado com a criança para poder aceitá-la, contribui muito
para tirar a criança do seu isolamento.
Finalmente
é, ainda, oportuno observar que existe a crença, infundada, de que
a institucionalização do jovem, num regime de internato, apresenta
resultados desfavoráveis, devido ao afastamento do aconchego materno.
No "Hilda Lewis House", em Camberwell, perto de Londres,
as crianças só são recebidas sob a condição de os pais aceitarem
ser integrados nos programas de treinamento. Segundo eles, o objetivo
principal é assumir temporariamente a criança, enquanto os pais
não conseguem fazer face à crise de comportamento.
Este
é, contudo, um conceito de origem psicanalítica e bastante controverso.
Algumas mães conseguem enfrentar o problema com bastante desenvoltura.
Nestes casos a participação dos pais é de extrema importância. Porém,
nem sempre a mãe tem estrutura para enfrentar tal situação. Sonia,
por exemplo, entrava em depressão e desespero, sem conseguir dar
uma contribuição positiva para o trabalho terapêutico. Em alguns
casos, a criança autista tem um comportamento tão comprometido que,
se a mãe não for muito forte, psiquicamente falando, isto pode provocar
uma completa desestruturação familiar, como prejuízos globais para
todos. Nesta situação é altamente recomendável o internamento em
uma clínica especializada. Esta solução é preconizada pela Dra.
Kitahara, da Escola Higashi. Segundo ela, a presença permanente
de uma criança altamente perturbada, no seio da família, provoca
uma total desestruturação e prejudica, em especial, seus irmãos.
A minha experiência me leva a concordar com ela.
É
preciso considerar, também, que muitas mães se deixam dominar, compreensivelmente,
por um sentimento de superproteção e até interferem na terapia,
prejudicando o trabalho terapêutico dos profissionais, agravando
a problemática. Esta atitude, aliás, não se aplica somente aos casos
de crianças com distúrbios de comportamento. Muitas mães estragam
seus filhos, mesmo quando eles são normais. Toda criança precisa
de limites, seja normal ou não. Quando a mãe não se conscientiza
desta necessidade, ela mais atrapalha do que ajuda.
Nós
não tínhamos, então, nenhuma experiência e muito do que fizemos
foi tateando no escuro ou pela casualidade. Não é difícil descobrir
que a socialização é extremamente importante. Ensinar o autista
a conviver e brincar com outras crianças é uma contribuição de enorme
valia. Aliás é de se notar que ninguém se entende melhor com uma
criança, do que outra criança. Mas esta convivência, esta participação
na sociedade, se defronta com uma enorme barreira. A barreira do
preconceito e da discriminação, que precisa ser vencida.
Como
se pode imaginar, é todo um trabalho complexo, difícil, de resultados
lentos e bastante caro, o que pode tornar difícil ou até impossível,
para muitos, uma terapia adequada.
(Do
livro "A Saga do Autismo" de Pedro Paulo Rocha – Fundador
da APARJ e da ABRA e presidente da APARJ) Reprodução autorizada
desde que seja citada a fonte e o autor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário