Filme mostra características da doença que afeta 70 milhões de pessoas no mundo
por Lara Ely
O transtorno que atinge o desenvolvimento do cérebro social — autismo — é tema de um tocante documentário gravado pela ONG Autismo & Realidade — Associação de Estudos e Apoio. Apresentado recentemente em Porto Alegre e batizado de Em Busca de um Novo Caminho — Desmistificando o Autismo, o filme de 45 minutos deve ser comercializado para um canal de televisão por assinatura nos próximos meses. Baseado na forma com o psiquiatra e idealizador da ONG Marcos Tomanik Mercadante (falecido em 2011) entendia a doença, o documentário conta com a participação de Júlia Balducci de Oliveira, portadora da Síndrome de Asperger, como assistente de direção. Formada em cinema, Júlia é portadora de uma desordem genética semelhante ao autismo e traz ao documentário a interferência real de uma pessoa que convive com o problema internamente, todos os dias. Confira a seguir a entrevista com ela:
Vida — Como foi para você fazer parte deste trabalho?
Júlia — Foi maravilhoso! Tive a oportunidade de aprender a me relacionar com os membros da equipe, me expor a situações novas e aprender sobre técnicas específicas de filmagem, roteiro e animação, além das sutilezas da profissão. Foi muito rica a experiência como assistente de direção e atriz.
Vida — Você aprendeu mais sobre você mesma fazendo este filme?
Júlia — Pude entrar em contato com outros casos de autismo e conhecer suas famílias. Tive contato com pessoas que passam por algumas coisas pelas quais eu passo também e isso foi muito bom para mim. Fiquei feliz em ver que esta experiência é o que realmente quero para a minha profissão...trabalhar com cinema.
Vida — Qual o principal mito que as pessoas têm sobre o autismo?
Júlia — Que são pessoas que ficam em suas casas, que não se relacionam com o mundo, que não têm sentimentos, que não entendem piadas e são incapazes de entrar para o mercado de trabalho. Para mim este filme é a oportunidade de demonstrar exatamente o contrário. Assim como eu, uma pessoa que tem a Síndrome de Asperger (uma das formas de autismo) pode estar no mercado de trabalho, sair de casa, conviver e participar...interagindo com as pessoas, gostando delas e amando o que faz, tais como: Steven Spielberg, Stanley Kulbrick e Alfred Hitchock.
Vida — Você enfrenta algum tipo de preconceito por causa da desinformação das pessoas?
Júlia — Muitos. As pessoas tendem a ignorar o que eu falo, o que eu penso, por não saberem lidar comigo. Elas não entendem que posso vir a gostar delas, querer a presença delas, mas não necessariamente irei querer beijá-las e abraçá-las.
Vida — Como o documentário ajuda a compreender os comportamentos de um autista?
Júlia — Conseguimos transmitir com esse documentário, exatamente a maneira com que o médico Marcos Tomanik Mercadante (in memorian) - compreendia o funcionamento do cérebro autista. Ele pensava que cada indivíduo com autismo é diferente um do outro, com comportamentos diferentes entre si. Por isso é importante planejar uma intervenção específica para cada um. A família é muito importante nesse processo e sem dúvida, ter tido um médico como ele e uma família como a minha, sempre por perto, acreditando e investindo o seu tempo em mim foi, é e sempre será muito importante para o meu desenvolvimento.
Livro é guia para entender doença
Leitura obrigatória para quem deseja entender melhor esta misteriosa doença, Mundo Singular (Editora Fontanar, 296 págs., R$ 39,90) aborda, além das questões médicas, uma série de emoções e assuntos práticos.
Escrito pela psiquiatra Ana Beatriz Barbosa em parceria com especialistas de sua equipe — Mayra Bonifácio Gaiato e Leandro Thadeu Reveles —, o livro é um guia para pais, professores e profissionais de saúde cujo foco é o funcionamento mental da criança com autismo e os elementos que influenciam sua vida: a família, a escola, o diagnóstico, o tratamento, a afetividade e as perspectivas futuras.
Confira, a seguir, trechos de um dos capítulos mais interessantes, de número nove, que traz as prováveis causas do autismo e seu funcionamento cerebral.
"Durante muitos anos, pais e cuidadores (muitas vezes, toda a família) de uma pessoa com autismo foram bombardeados com informações inadequadas sobre as causas do transtorno, que geravam culpa e sofrimento sem propósitos.
Entender as causas do autismo desmistifica uma série de teorias que relacionam a sintomatologia com padrões de cuidados dos pais. Mesmo após décadas, algumas teorias ainda são usadas por profissionais desavisados, e não é incomum encontrarmos mães desoladas por se sentirem responsáveis pelo autismo do filho. Os estudos genéticos nos dão uma boa base para entender o problema".
"Vários estudos e pesquisas estão focados na ligação entre os genes e o autismo. O maior deles é o Projeto Genoma do Autismo (Autism Genome Project), da Aliança Nacional para Pesquisa sobre Autismo (National Alliance for Autism Research). Esses estudos, realizados em aproximadamente 50 instituições de 19 países, investigam os 30 mil genes que forma o genoma humano, com o objetivo de identificar aqueles que desencadeiam o autismo.
Estima-se que aproximadamente 15 genes seriam os "candidatos" do autismo, isto é, uma pessoa que tiver uma associação desses genes teriam genes teriam maior probabilidade de desenvolver autismo".
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