terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

A abordagem interacionista, responsiva, motivacional e lúdica da Inspirados pelo Autismo

A Inspirados pelo Autismo foi fundada em 2008 com a intenção de servir às necessidades de pessoas com autismo e suas famílias para:

  • Promover a expansão e divulgação do conhecimento relativo ao autismo;
  • Disponibilizar serviços atualizados, personalizados e inspiradores para as famílias e profissionais ligados a crianças e adultos com autismo e transtornos globais do desenvolvimento.
Tratamento de autismo - Uma abordagem lúdica
Crianças e adultos com autismo apresentam dificuldades na aprendizagem da habilidade de orientação social, no desenvolvimento de habilidades como a atenção compartilhada (prestar atenção à mesma atividade ou ao tópico que outra pessoa está prestando) e o compartilhar experiências emocionais com os outros. Estes são passos cruciais durante os primeiros anos do desenvolvimento da criança e formam a fundação para todo o aprendizado social. Sem a habilidade de atenção compartilhada, a criança não é capaz de sustentar uma conversa ou até envolver-se em uma simples brincadeira de cócegas por muito tempo. De maneira similar, esta criança não consegue colocar-se “no lugar de outra pessoa” e imaginar o que a outra pessoa possa estar pensando ou sentindo, o que é vital para a participação em trocas sociais dinâmicas e espontâneas. O desenvolvimento da atenção compartilhada, da flexibilidade social, do contato visual, da comunicação receptiva e expressiva são fundamentais para que a criança com autismo não fique perdida na arena social.

Ao considerar o desenvolvimento da habilidade de atenção compartilhada uma fundação para os outros aprendizados, utilizamos uma abordagem interacionista que valoriza o relacionamento com a pessoa que apresenta características do espectro do autismo. Investimos em interações divertidas com a criança que incentivem o desejo por mais participações espontâneas em interações. Queremos que a criança aprenda a ser ativa na interação social e que se interesse cada vez mais pelo que o outro faz ou fala. Para tanto, é essencial que sejamos pessoas interessantes para ela, pessoas com quem ela goste de estar! Procuramos então ser divertidos, compreensivos, prestativos, amorosos, demonstrando nosso respeito e admiração pela criança em nossas interações diárias com ela.
Tratamento de autismo - Uma abordagem lúdica
Muitas das pessoas com autismo apresentam grandes dificuldades de comunicação. O estilo responsivo de interação tem como princípio responder aos sinais e comunicações da criança para atender aos seus interesses e necessidades. Respondendo de forma imediata, positiva e intensa à maior parte das tentativas de comunicação da criança, demonstramos a função e o poder de sua comunicação, e a estimulamos a querer se comunicar conosco com maior frequência e qualidade.

Quanto mais motivada a criança estiver para interagir conosco espontaneamente, maior será o seu envolvimento, participação e aprendizado. Queremos então inspirar a criança a se sentir motivada para interagir, superar suas dificuldades e aprender. A avaliação das habilidades atuais da criança identifica os próximos passos a serem trabalhados e estimulados (as metas educacionais), e as informações relativas aos atuais interesses, estilo de aprendizagem e preferências sensoriais da criança auxiliam a elaboração personalizada de atividades interativas motivacionais, interessantes e divertidas, que proporcionem a oportunidade da criança desenvolver suas habilidades.
Investimos na motivação intrínseca para a participação nas atividades. Se a criança participa da atividade interativa apenas para ganhar no final um prêmio externo como, por exemplo, um chocolate, a motivação neste caso é extrínseca à atividade, externa, sem conexão direta com a atividade. Se a criança participa da atividade interativa porque tanto o papel do adulto como o papel da criança nesta atividade são interessantes para ela, a motivação é intrínseca, diretamente ligada à atividade. Quanto mais intrínseca for a motivação em uma atividade, mais tempo a criança tenderá a querer permanecer nela e maior a disponibilidade para superar seus desafios.
O elemento lúdico promove a flexibilização e expansão do pensamento, a curiosidade pelo novo, a criatividade e a expressividade, em um ambiente em que a criança se sente segura e confortável para explorar novas possibilidades, criar conexões, desenvolver novas habilidades. É o aprender brincando.
Os princípios da abordagem interacionista, responsiva, motivacional e lúdica também são aplicados no trabalho com um adulto. As atividades são adaptadas para serem motivadoras e apropriadas ao estágio de desenvolvimento específico do indivíduo, qualquer que seja sua idade. Uma vez que a pessoa com autismo esteja motivada para interagir com um adulto, este adulto facilitador poderá então criar interações que a ajudarão a aprender as habilidades do desenvolvimento que são aprendidas através de interações dinâmicas com outras pessoas (por exemplo, o contato visual “olho no olho”, as habilidades de linguagem e de conversação, o brincar, a imaginação, a criatividade, as sutilezas do 
Tratamento de autismo - Uma abordagem lúdica
relacionamento humano), e habilidades emocionais, sensório-motoras, de vida diária e de cognição.

Propomos a implementação de um programa de desenvolvimento contando com a participação fundamental dos pais, o acompanhamento de uma equipe profissional multidisciplinar, a parceria da escola e a possível colaboração de voluntários. Para muitas famílias, recomendamos um programa de desenvolvimento que inclua sessões responsivas e lúdicas na residência da criança ou adulto com autismo. As sessões domiciliares podem ser realizadas em qualquer ambiente da residência ou em um quarto especialmente preparado para as necessidades sensoriais da criança, contendo brinquedos e materiais motivadores que sirvam como instrumento de facilitação para a interação e subseqüente aprendizagem.

Colocando em prática o estilo responsivo de interação

A criança com características do espectro do autismo apresenta dificuldades para interagir e se comunicar. Na residência da criança, em uma clínica, ou até na escola quando possível, reserve um tempo para ser especialmente responsivo à sua criança (Ver página sobre o estilo responsivo na escola). Ao ser responsivo aos desejos e às iniciativas sociais da criança, sendo prestativo e respondendo positivamente ao que ela quer, você estará facilitando e encorajando mais interações com ela. A atitude responsiva não poderá ser utilizada o tempo todo, pois precisaremos também impor limites e lidar com os direitos e desejos das outras pessoas, mas podemos aumentar a porcentagem do tempo em que somos responsivos com a criança, principalmente em ambientes especialmente preparados para ela e e nos quais ela tenha nossa total atenção.
Se sua criança demonstrar para você com gestos, sons, palavras ou olhares que deseja algo (e que seja possível para você dar), seja prestativo e responda imediatamente oferecendo a ela o que ela deseja. Mostre claramente que as iniciativas sociais da criança são eficazes para conseguir sua ajuda. Quanto mais a criança interagir com você, mais ela aprenderá com você. Com o tempo, em interações prazerosas e de confiança, você poderá ajudar sua criança a comunicar-se de formas cada vez mais complexas e eficazes.
A atenção compartilhada ou conjunta (prestar atenção ao mesmo que a outra pessoa) é a base para o aprendizado social da criança. Queremos que a criança tenha experiências prazerosas ao interagir conosco para motivá-la a querer interagir mais vezes. Nada melhor então do que brincar! Observe o que a sua criança está gostando de fazer e brinque com ela, divirta-se. Quando ela estiver receptiva para brincar com você, ofereça ideias para expandir a brincadeira. Conhecendo os interesses da criança, você também pode criar e sugerir atividades interativas que sejam interessantes para ela e que possibilitem mais interações e oportunidades para que as metas educacionais (aquilo que você gostaria de ajudá-la a aprender naquele momento) sejam trabalhadas. As metas educacionais podem ser trabalhadas de forma divertida no decorrer da interação prazerosa. (Veja os exemplos de atividades interativas na próxima página.)

Brincadeira imitativa

No momento em que a criança não apresenta disponibilidade para interagir, ao invés de forçá-la a brincar conosco, podemos utilizar uma estratégia responsiva que crianças de desenvolvimento típico utilizam nos primeiros anos de vida: brincar em paralelo com as outras crianças. Quando brincamos em paralelo, observamos as ações da outra pessoa e espelhamos ou imitamos essas ações demonstrando nosso interesse no que a pessoa faz. É uma forma não invasiva de aproximação. Aos poucos, a criança que está sendo espelhada pode passar a espontaneamente prestar atenção em nós interessada em nossa ação, o que leva ao desenvolvimento da habilidade de atenção compartilhada! Ao sermos observados pela criança, podemos tentar expandir nossas ações oferecendo variações da ação imitada, ações motivadoras que estimulem a criança a permanecer interativa, e quem sabe conseguir até que a criança passe a nos imitar e a responder positivamente a desafios divertidos.
Pesquisas empíricas como as citadas abaixo demonstraram que a imitação das atividades da criança pode estimular o desenvolvimento de habilidades sociais, como o aumento do contato visual, maior atenção compartilhada e interesse no adulto, maior habilidade para imitar o adulto, maior disponibilidade para aproximar-se fisicamente e brincar junto.
  • Dawson, G. & Galpert, L. (1990). Mothers’ use of imitative play for facilitating social responsiveness and toy play in young autistic children. Development and Psychopathology, 2, 151-162.
  • Field, T., Field, T., Sanders, C., Nadel, J. (2001). Children with Autism Display more Social Behaviors after Repeated Imitation Sessions. Autism, 5(3), 317-323.
  • Ledford, J. & Wolery, M. (2011). Teaching Imitation to Young Children With Disabilities: A Review of the Literature. Topics in Early Childhood Special Education, 30 (4), 245-255.
  • Rogers, S. J., Hepburn, S. L., Stackhouse, T., & Wehner, E. (2003). Imitation performance in toddlers with autism and those with other developmental disorders. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 44, 763-781.
  • Sanefuji, W. & Ohgami, H. (2011). Imitative behaviors facilitate communicative gaze in children with autism. Infant Mental Health Journal, 32, (134–142). (Read Abstract).
  • Sanefuji W., Yamashita H., Ohgami H. (2009). Shared minds: Effects of a mother’s imitation of her child on the mother–child interaction. Infant Mental Health Journal. 30(2), pp. 145-157. (Read Abstract).
  • Sanefuji W., Ohgami H. (2013). ‘Being-imitated’ strategy at home-based intervention for young children with autism. Infant Mental Health Journal. 34(1), pp. 72–79. (Read Abstract).
  • Tiegerman, E. and Primavera, L.H. (1984) Imitating the autistic child: Facilitating communicative gaze behavior. Journal of Autism and Developmental Disorders; 14(1): 27-38.
  • Dawson, G. & Adams, A (1984). Imitation and social responsiveness in autistic children. Journal of Abnormal Child Psychology, 12(2), 209-226.

Nas próximas páginas, apresentamos alguns exemplos de atividades interativas educacionais que desenvolvemos em sessões responsivas com crianças, adolescentes e adultos. Oferecemos também dicas para as atividades de vida diária; como criar um ambiente físico para o trabalho em casa, na clínica e na escola; ebrinquedos e materiais úteis para o aprendizado.
A seguir, listamos algumas pesquisas que demonstraram resultados positivos alcançados através de abordagens interacionistas, responsivas e lúdicas:
  • Casenhiser D, Shanker SG, Stieben J. (2011) Learning Through Social Interactions in Children with Autism: Preliminary Data from a Social-Communications-Based Intervention. Autism 26 Sept: 1-22.
  • Dawson, G., Rogers, S., et al. (2010) RCT of an Intervention for Toddlers with Autism: The Early Start Denver Model. Pediatrics, 125(1).
  • Green, J., Charman, T., McConachie, H. et al Parent-mediated communication-focused treatment in children with autism (PACT): a randomized controlled trial. Lancet Online May 21, 2010.
  • Greenspan, S.I., and Wieder, S. “Developmental Patterns and Outcomes in Infants and Children with Disorders in Relating and Communication: A Chart Review of 200 Cases of Children with Autistic Spectrum Disorders”. The Journal of Developmental and Learning Disorders, Volume 1, No. 1 (1997b):87-141.
  • Ingersoll, Brooke, A. Dvortcsak, C. Whalen, and D. Sikora. (2005) “The Effects of a Developmental, Social-Pragmatic Language Intervention on Rate of Expressive Language Production in Young Children With Autistic Spectrum Disorders.” Focus of Autism and Other Developmental Disorders 20(4), 213-222.
  • Kasari C, Gulsrud AC, Wong C, Kwon S and Locke J (2010) Randomized controlled caregiver mediated joint engagement intervention for toddlers with autism. Journal of Autism and Developmental Disorders 40(9): 1045–1056.
  • Kasari, C., Paparella, T., Freeman, S., & Jahromi, L.B. (2008). Language outcome in autism: randomized comparison of joint attention and play interventions. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 76(1), 125-137.
  • Kim, J. and Mahoney, G. (2004) The effects of mother’s style of interaction on children’s engagement: implications for using responsive interventions with parents. Topics in Early Childhood Special Education 24(1), 31-38.
  • Koegel, R.L., Koegel, L.K. and Carter, C.M. (1998) Pivotal responses and natural language teaching paradigm. Seminars in Speech and Language, 19(4), 355-371.
  • Koegel, R.L., Dyer, K. and Bell, L.K. (1987) The influence of child prefered activities on autistic children’s social behavior. Journal of Applied Behavior Analysis, 20(3), 243-252.
  • Landa, R.J., Holman, K.C., O’Neill, A.H., Stuart, E.A. (2011) Intevention targeting development of socially synchronous engagement in toddlers with autism spectrum disorder: a randomized controlled trial. Journal of Child Psychology and Psychiatry. 52:1, pp 13-21.
  • Krebs Seida, J., Ospina, M., Karkhaneh, M., Hartling, L., Smith, V., Clark, B. (2009).
  • Systemic reviews of psychosocial interventions for autism: An umbrella review, Developmental Medicine & Child Neurology, 51: 95-104.
  • Mahoney G and Perales F (2003) Using relationship-focused intervention to enhance the social emotional functioning of young children with autism spectrum disorders. Topics in Early Childhood Special Education 23(2): 74–86.
  • Mahoney, G., and F. Perales. (2005) “Relationship-focused early intervention with children with pervasive developmental disorders and other disabilities: a comparative study.” Journal of Developmental & Behavioral Pediatrics 26(2): 77-85.
  • McConachie H., V. Randle, D. Hammal, and A. Le Couteur. “A controlled trial of a training course for parents of children with suspected autism spectrum disorder.” Journal of Pediatrics 147, (2005): 335-340.
  • Ospina, M., Krebs Seida, J., Clark, B., Karkhaneh, M., Hartling, L., Tjosvold, L., Vandermeer, B., Smith, V. (2008) Behavioural and Developmental Interventions for Autism Spectrum Disorder: A Clinical Systematic Review, PLoS ONE 3(11): e3755. doi:10.1371/journal.pone.0003755.
  • Pajareya, K., Nopmaneejumruslers, K. (2011) A pilot RCT of DIR/Floortime parent training intervention for pre-school children with ASD. Autism, 15(2),1-15.
  • Prizant BM and Wetherby AM (1998) Understanding the continuum of discrete-trial traditional behavioral to social-pragmatic developmental approaches to communication enhancement for young children with autism/PDD. Seminars in Speech and Language 19:329–353.
  • Reichow B., Volkmar, Cicchetti (2008) Development of the Evaluative Method for Evaluating and Determining Evidence-Based Practices in Autism J Autism Dev Disord 38:1311.
  • Roberts, M., & Kaiser, A. (2011) The Effectiveness of Parent-Implemented Language Intervention: A MetaAnalysis.American Journal of Speech-Language Pathology, 20, 180-199.
  • Seida, Ospina, Karkhaneh, Hartling, Smith, and Clark. (2009) Developmental Medicine and Child Neurology, 51.95-104 Systematic reviews of psychosocial interventions for autism: an umbrella review.
  • Siller, M., & Sigman M. (2002) The behaviors of parents of children with autism predict the subsequent development of their children’s communication. Journal of Autism and Developmental Disorders, 32(2), 77-89.
  • Solomon, R., J. Necheles, C. Ferch, and D. Bruckman (2007) “Pilot study of a parent training program for young children with autism: The P.L.A.Y. Project Home Consultation program.” Autism 11, no. 3 205-224.

A participação espontânea da criança em interações dinâmicas, envolventes e estimulantes é fator chave para o desenvolvimento de habilidades socioemocionais, cognitivas, sensório-motoras, de comunicação e de vida diária.


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