Programas não dispensam acompanhamento especializado, como o de fonoaudiólogos e terapeutas
'Quando você sai com uma criança autista para almoçar fora é difícil fazer com que ela fique sentada e se comporte como a sociedade espera. Com o aparelho, ela pode brincar e se distrair nem que seja por 10 minutos' - Murilo Saraiva Queiroz, pai de Max |
Max
é um lindo garotinho de 6 anos e meio. Em seu mundo, repleto de
referências dos desenhos animados que vê no tablet, dizer "e no episódio
de hoje…" é o mesmo que perguntar sobre a programação do dia para os
seus pais. Quando quer se despedir, ele solta: "Foi uma aventura muito
divertida, não acham?". O menino é autista (tem disfunção global do
desenvolvimento) e as expressões usadas são reflexo da ecolalia,
repetição de palavras aleatórias. Com o tempo, assistindo à seleção de
seus episódios favoritos, ele aprendeu a usar os termos das animações no
contexto correto.
O pai, Murilo Saraiva de Queiroz, de 36 anos, é projetista de hardware da Nvidia e tem uma coluna sobre tecnologia na revista Autismo (revistaautismo.com.br). Ele conta que o filho nasceu com uma cardiopatia congênita grave e ficou internado muito tempo. O longo período de internação e uma traqueostomia (abertura feita na traqueia) a que foi submetido fizeram com que Max demorasse a falar e ter um grande atraso na capacidade de se comunicar.
Foi só depois de ver um documentário na TV sobre autistas que Murilo percebeu que o filho se encaixava nesse perfil. Com 2 anos e meio, um especialista confirmou o diagnóstico. Desde então, o garoto faz terapia ocupacional e tem sessões com psicóloga e fonoaudióloga. Hoje ele fala, obedece a comandos e está aprendendo a ler.
Interessado em softwares, Queiroz sempre tentou fazer com que o filho usasse o PC, mas manusear o mouse era tarefa impossível para Max. "No computador você leva o mouse para a setinha ir até a imagem, para então ela reagir. No tablet não. É na hora. É muito concreto, uma resposta imediata e a interação é fácil para o autista", explica Queiroz. Ele diz preferir dispositivos móveis Android porque a diferença de custo, se comparado a um iPad, é muito grande e não compensa arcar com o risco de quebras, perdas e outros acidentes.
O pai, Murilo Saraiva de Queiroz, de 36 anos, é projetista de hardware da Nvidia e tem uma coluna sobre tecnologia na revista Autismo (revistaautismo.com.br). Ele conta que o filho nasceu com uma cardiopatia congênita grave e ficou internado muito tempo. O longo período de internação e uma traqueostomia (abertura feita na traqueia) a que foi submetido fizeram com que Max demorasse a falar e ter um grande atraso na capacidade de se comunicar.
Foi só depois de ver um documentário na TV sobre autistas que Murilo percebeu que o filho se encaixava nesse perfil. Com 2 anos e meio, um especialista confirmou o diagnóstico. Desde então, o garoto faz terapia ocupacional e tem sessões com psicóloga e fonoaudióloga. Hoje ele fala, obedece a comandos e está aprendendo a ler.
Interessado em softwares, Queiroz sempre tentou fazer com que o filho usasse o PC, mas manusear o mouse era tarefa impossível para Max. "No computador você leva o mouse para a setinha ir até a imagem, para então ela reagir. No tablet não. É na hora. É muito concreto, uma resposta imediata e a interação é fácil para o autista", explica Queiroz. Ele diz preferir dispositivos móveis Android porque a diferença de custo, se comparado a um iPad, é muito grande e não compensa arcar com o risco de quebras, perdas e outros acidentes.
Saiba mais...
Jeitinho brasileiro para a inovação
Empresa brasileira desenvolve aplicativos para portadores de distúrbios de linguagem e articulação
Para Queiroz, o fato de a criança adorar o
tablet já é uma grande vantagem. O filho está no seu segundo aparelho,
um Gênesis, porque literalmente destruiu o primeiro, um Asus
Transformer, de tanto que usou. "Quando você sai com uma criança autista
para almoçar fora é difícil fazer com que ela fique sentada e se
comporte como a sociedade espera. Com o aparelho, ela pode brincar e se
distrair nem que seja por 10 minutos", diz. Ele explica que o autismo é
mais sutil que a síndrome de Down e as pessoas não costumam ter
paciência – se uma criança autista grita no supermercado, todo mundo
acha que é birra infantil.
APP PARA CADA CASO
Ao contrário de muitos indivíduos, Max não precisa do tablet para comunicação, mas como reforço de comportamento, melhora da coordenação motora e entretenimento. O menino gosta de jogos comuns, como o Angry Birds. O game, inclusive, instigou a curiosidade do garoto a tal ponto que ele aprendeu a usar o mouse do computador para jogar a versão web.
Para Queiroz, existem aplicativos de categorias específicas que são muitos úteis, mas o interesse que eles despertam é muito amplo e depende do desenvolvimento e da relação da família com a pessoa deficiente. O próprio autismo tem diferentes níveis, há crianças que não falam, não interagem de forma alguma, e outros que chegam até a faculdade.
Atualmente, os aplicativos para comunicação assistida são os mais usuais, como o Livox (agoraeuconsigo.org) e a fase 3 do PECS (pecs.com). Eles foram inspirados em grandes fichários impressos com figuras simples de ações, objetos e pessoas. Bastava tocar a ficha. O problema é que com o tempo os cartões se multiplicavam e desperdiçava-se um tempo precioso nessa conversa. "Depois, passaram a fazer computadores sob encomenda, caríssimos (cerca de R$ 30 mil), com teclado de figuras. Com o tablet isso ficou muito mais acessível", diz.
O aplicativo não é a peça mais importante para o desenvolvimento de alguém com dificuldade de comunicação, segundo Queiroz. Estabelecer o contato, para ele, é o mais complicado. "Se a pessoa não está treinada, não senta e tenta explorar o aplicativo junto com o autista, não vai adiantar. É importante saber a necessidade dela, escolher o programa e o apresentar de um jeito produtivo", afirma.
Jeitinho brasileiro para a inovação
Analista que criou aplicativo de comunicação alternativa para pessoas com deficiência lançará no próximo mês recurso de inteligência artificial. Programas para iPad são alternativa para autistas
Clara
tem 5 anos de idade. Por um erro médico no parto, está presa a um corpo
que não obedece aos seus comandos – tem paralisia cerebral. Ela
demonstra o que quer aos pais por meio da comunicação alternativa.
Antes, se ela gostava de um iogurte, era preciso imprimir uma figura,
plastificar e colocar em um fichário junto a centenas de outras imagens
para que ela escolhesse. Adicionar novidades era um “parto na montanha”,
como lembra o pai, Carlos Edmar Pereira, de 35 anos, analista de
sistemas e também diretor da clínica de fisioterapia Reamo, em Recife
(PE). Ele então decidiu ir atrás de empresas para desenvolver um
software alternativo, mas ninguém se interessou em fazer uma plataforma
em português. Diante disso, resolveu ele mesmo criar um programa: o
Livox (agoraeuconsigo.org). Nele a comunicação acontece a partir de
toques em imagens apresentadas na tela do tablet. Fome, medo, desejos,
tudo está dividido em contextos para que o deficiente possa expressar a
sua vontade.
A experiência com Clara começou com telas de “sim” ou “não” no smartphone e, com o tempo, por meio de um trabalho duro com uma equipe de fonoaudiólogos, Pereira desenvolveu um dos mais completos sistemas de comunicação alternativa para dispositivos móveis. Neste mês, o Livox foi escolhido como o melhor aplicativo de inclusão e empoderamento do Brasil pelo WSA, concurso promovido pela Organização das Nações Unidas. De 23 a 26 de outubro, a empresa representará o Brasil na premiação global no Sri Lanka.
Pereira lembra que no Brasil há 2 milhões de deficientes visuais e 10 milhões de surdos, porém, existe um contingente de 15 milhões de pessoas que não falam porque têm paralisia, autismo, sofreram derrame ou outro mal qualquer. Para ele, elas são invisíveis. “Uma mãe outro dia me contou que foi à padaria com uma blusa com dizeres sobre o autismo e perguntaram a ela se não era aquela doença que as pessoas enxergam em preto e branco”, conta Pereira para exemplificar o desconhecimento popular. Ele explica que o grande benefício do app é atender as mais variadas deficiências: de motora a cognitiva.
O empresário conta que foi nítido o desenvolvimento de Clara depois que ela começou a usar o Livox. Outro dia ele estava lendo um livro sobre a Terra para ela e perguntou se ela sabia o que era magnetismo. Usando a tela do sim/não descobriu que Clara sabia muito mais do que ele imaginava e tinha visto tudo na TV. Com o programa, ele, enfim, pode conversar de verdade com sua filha. O corpo não responde perfeitamente, mas a mente de Clarinha está a mil.
Na página do Livox no Facebook, mães deixam
seus depoimentos emocionados sobre a diferença que a plataforma tem
feito na comunicação com seus filhos. Com o programa, Marina Gaya, que
já foi dona de uma das maiores comunidades do Orkut sobre paralisia
cerebral, descobriu que o filho Emanuel, acometido pela doença, torcia
para o São Paulo. “É, depois de sete anos e meio de silêncio, enfim,
Emanuel e eu ‘batendo papo’. Estou redescobrindo o meu filho e
percebendo que tenho em casa um menininho muito do sabido, com opiniões
bem formadas e mais consciência do que se passa ao seu redor do que eu
tinha sonhado em meus maiores devaneios”, escreveu.
MULTIMÍDIA
Um dos recursos mais incríveis da ferramenta é o intellitouch, o toque inteligente. Há pessoas com deficiência que não têm coordenação do toque. Diante disso, ele calcula quantos dedos estão na tela mais a coordenada que foi tocada e estima qual a intenção real do usuário. Nos próximos meses, deve ser lançada a funcionalidade “capta”, capaz de comandar o app a partir do movimento dos olhos. “Já vi algumas tecnologias por aí, mas, se o usuário mexe a cabeça, perde a calibração, então estamos trabalhando nisso ainda”, conta. Outra novidade que estará pronta no mês que vem é o Now, recurso de inteligência artificial. Baseada no horário e no GPS do tablet, a plataforma mostrará telas com conjuntos sensíveis ao contexto. O da escola é diferente do da casa e assim por diante.
Diferentemente do PECS, o aplicativo é multimídia. Há um banco com 12 mil imagens, mas é possível tirar novas ou pegar na internet e acrescentar ao conteúdo. “Um usuário do Livox, por exemplo, ficava excluído na aula de música. A professora colocou uma flauta no sistema e hoje ele participa. É simples: se forem clicados pontos específicos, ele toca. Se o toque for em qualquer outro ponto fora do desenho da tela, a execução da música é interrompida”, conta.
PREFERÊNCIA PELO ANDROID
Por enquanto, o Livox está disponível só para plataformas Android. Pereira explica que fez essa escolha porque, além da variedade de opções de marcas de tablets, com tamanhos diversos, o custo é menor. “Com Android dá para fazer coisas que não é possível com o iPad. Por exemplo, a mãe pode pegar um arquivo de um filme e colocar no tablet para o filho. No iOS isso é considerado pirataria”, lembra.
O programa começou gratuito, mas hoje tem licença permanente por R$ 1.350, com direito às atualizações. Pereira explica que o valor cobre o custo de diversas tecnologias de terceiros que são utilizadas no app. Com o passar dos anos, teclado virtual, recurso para gravação de áudio, autocontraste e opção de 25 idiomas foram algumas das melhorias implementadas na plataforma. Atualmente, são 2 mil usuários.
Pereira conta que também está criando o Livox profissional, destinado a escolas e hospitais. Dessa forma, médicos poderão fazer perfis com necessidades de comunicação diferentes para o tratamento de pacientes com autismo de autorrendimento, paralisia espástica etc. A licença é dada por tablet. Em uma instituição de ensino, por exemplo, um professor pode usar um aparelho para sua turma inteira. A escola Dia a Dia em Belo Horizonte utiliza o Livox e há clientes também nas cidades mineiras de Juiz de Fora e João Monlevade.
O Livox não está disponível no Google Play, porque, segundo seu criador, é um produto médico, em que é preciso o acompanhamento de profissionais para a sua utilização. Os especialistas avaliam se é preciso um acionador ou um tablet com tela maior. “Muita gente acha que é brincadeira. Acredita que é só jogar na mão da pessoa e ela já sai falando. É preciso um trabalho com fonoaudióloga e com um terapeuta ocupacional. O pai não sabe se o filho vai entender o desenho de uma maçã. Pode ser que ele compreenda somente a foto”, justifica. Quando há interesse em adquirir o aplicativo, a pessoa deve entrar em contato por meio do site.
Do papel ao touch
Em 1985, dois norte-americanos, da empresa Pyramid, Andy Bond e Lori Frost, criaram o Picture Exchange Communication System (pecs.com), mais conhecido como PECS, que é um sistema de comunicação por troca de figura. O modelo promove a comunicação aumentativa (para aqueles que têm alguma dificuldade) ou alternativa (para aqueles que não falam). O PECS ensina o indivíduo a dar uma figura de um item desejado para um parceiro de comunicação. O sistema é dividido em seis fases, com objetivos cada vez mais desafiadores à medida que se passa de uma para outra. Nas fases mais avançadas, os indivíduos são ensinados a responder a perguntas e fazer comentários.
No ano passado, a fonoaudióloga Soraia Cunha Peixoto Vieira, de 37 anos, trouxe o método para o Brasil e abriu a sede da diretoria geral da Pyramid em Belo Horizonte (MG). Ela trabalhou 12 anos com o PECS na Inglaterra. Vieira conta que, nas fases 1 e 2, a pessoa estuda o método e aprende que precisa escolher uma figura e entregá-la ao seu interlocutor. Já na 3, ela discrimina a figura. É para esse ponto que foi criado o aplicativo do PECS para iPad (http://bit.ly/14gLxm4). Há usuários de 18 meses a 83 anos de idade. O app permite incluir novas figuras no banco e tem opção de gravar voz.
Outro aplicativo da Pyramid disponível é o Working4 (http://bit.ly/1b9sOKW), com tradução para o português e custo de US$ 2,99. Com ele, é possível reforçar comportamentos positivos – para ter um pedido atendido é preciso fazer tarefas específicas discriminadas no programa.
Na fase 4, o PECS ensina a formar frases juntando duas figuras: “Eu quero” e “comer”, por exemplo. Na 5, o usuário responde a perguntas e na 6 ele faz comentários sobre o cotidiano. A equipe já trabalha para criar aplicativos para as próximas fases, mas ainda não há previsão do lançamento.
Vieira acredita que é importante fazer um treinamento do método para tirar total proveito do PECS, especialmente os pais, para poderem usar com os filhos em todos os lugares. “O método é o mesmo para todo mundo, mas cada um vai evoluir do seu jeito”, ressalva.
APP PARA CADA CASO
Ao contrário de muitos indivíduos, Max não precisa do tablet para comunicação, mas como reforço de comportamento, melhora da coordenação motora e entretenimento. O menino gosta de jogos comuns, como o Angry Birds. O game, inclusive, instigou a curiosidade do garoto a tal ponto que ele aprendeu a usar o mouse do computador para jogar a versão web.
Para Queiroz, existem aplicativos de categorias específicas que são muitos úteis, mas o interesse que eles despertam é muito amplo e depende do desenvolvimento e da relação da família com a pessoa deficiente. O próprio autismo tem diferentes níveis, há crianças que não falam, não interagem de forma alguma, e outros que chegam até a faculdade.
Atualmente, os aplicativos para comunicação assistida são os mais usuais, como o Livox (agoraeuconsigo.org) e a fase 3 do PECS (pecs.com). Eles foram inspirados em grandes fichários impressos com figuras simples de ações, objetos e pessoas. Bastava tocar a ficha. O problema é que com o tempo os cartões se multiplicavam e desperdiçava-se um tempo precioso nessa conversa. "Depois, passaram a fazer computadores sob encomenda, caríssimos (cerca de R$ 30 mil), com teclado de figuras. Com o tablet isso ficou muito mais acessível", diz.
O aplicativo não é a peça mais importante para o desenvolvimento de alguém com dificuldade de comunicação, segundo Queiroz. Estabelecer o contato, para ele, é o mais complicado. "Se a pessoa não está treinada, não senta e tenta explorar o aplicativo junto com o autista, não vai adiantar. É importante saber a necessidade dela, escolher o programa e o apresentar de um jeito produtivo", afirma.
Jeitinho brasileiro para a inovação
Analista que criou aplicativo de comunicação alternativa para pessoas com deficiência lançará no próximo mês recurso de inteligência artificial. Programas para iPad são alternativa para autistas
Com paralisia cerebral, Emanuel agora expressa seus gostos, como ser torcedor do São Paulo, e consegue se comunicar com os amigos numa praça de alimentação |
A experiência com Clara começou com telas de “sim” ou “não” no smartphone e, com o tempo, por meio de um trabalho duro com uma equipe de fonoaudiólogos, Pereira desenvolveu um dos mais completos sistemas de comunicação alternativa para dispositivos móveis. Neste mês, o Livox foi escolhido como o melhor aplicativo de inclusão e empoderamento do Brasil pelo WSA, concurso promovido pela Organização das Nações Unidas. De 23 a 26 de outubro, a empresa representará o Brasil na premiação global no Sri Lanka.
Pereira lembra que no Brasil há 2 milhões de deficientes visuais e 10 milhões de surdos, porém, existe um contingente de 15 milhões de pessoas que não falam porque têm paralisia, autismo, sofreram derrame ou outro mal qualquer. Para ele, elas são invisíveis. “Uma mãe outro dia me contou que foi à padaria com uma blusa com dizeres sobre o autismo e perguntaram a ela se não era aquela doença que as pessoas enxergam em preto e branco”, conta Pereira para exemplificar o desconhecimento popular. Ele explica que o grande benefício do app é atender as mais variadas deficiências: de motora a cognitiva.
O empresário conta que foi nítido o desenvolvimento de Clara depois que ela começou a usar o Livox. Outro dia ele estava lendo um livro sobre a Terra para ela e perguntou se ela sabia o que era magnetismo. Usando a tela do sim/não descobriu que Clara sabia muito mais do que ele imaginava e tinha visto tudo na TV. Com o programa, ele, enfim, pode conversar de verdade com sua filha. O corpo não responde perfeitamente, mas a mente de Clarinha está a mil.
Saiba mais...
Aplicativos para tablets ajudam pessoas com dificuldades de comunicação
Empresa brasileira desenvolve aplicativos para portadores de distúrbios de linguagem e articulação
MULTIMÍDIA
Um dos recursos mais incríveis da ferramenta é o intellitouch, o toque inteligente. Há pessoas com deficiência que não têm coordenação do toque. Diante disso, ele calcula quantos dedos estão na tela mais a coordenada que foi tocada e estima qual a intenção real do usuário. Nos próximos meses, deve ser lançada a funcionalidade “capta”, capaz de comandar o app a partir do movimento dos olhos. “Já vi algumas tecnologias por aí, mas, se o usuário mexe a cabeça, perde a calibração, então estamos trabalhando nisso ainda”, conta. Outra novidade que estará pronta no mês que vem é o Now, recurso de inteligência artificial. Baseada no horário e no GPS do tablet, a plataforma mostrará telas com conjuntos sensíveis ao contexto. O da escola é diferente do da casa e assim por diante.
Diferentemente do PECS, o aplicativo é multimídia. Há um banco com 12 mil imagens, mas é possível tirar novas ou pegar na internet e acrescentar ao conteúdo. “Um usuário do Livox, por exemplo, ficava excluído na aula de música. A professora colocou uma flauta no sistema e hoje ele participa. É simples: se forem clicados pontos específicos, ele toca. Se o toque for em qualquer outro ponto fora do desenho da tela, a execução da música é interrompida”, conta.
PREFERÊNCIA PELO ANDROID
Por enquanto, o Livox está disponível só para plataformas Android. Pereira explica que fez essa escolha porque, além da variedade de opções de marcas de tablets, com tamanhos diversos, o custo é menor. “Com Android dá para fazer coisas que não é possível com o iPad. Por exemplo, a mãe pode pegar um arquivo de um filme e colocar no tablet para o filho. No iOS isso é considerado pirataria”, lembra.
O programa começou gratuito, mas hoje tem licença permanente por R$ 1.350, com direito às atualizações. Pereira explica que o valor cobre o custo de diversas tecnologias de terceiros que são utilizadas no app. Com o passar dos anos, teclado virtual, recurso para gravação de áudio, autocontraste e opção de 25 idiomas foram algumas das melhorias implementadas na plataforma. Atualmente, são 2 mil usuários.
Pereira conta que também está criando o Livox profissional, destinado a escolas e hospitais. Dessa forma, médicos poderão fazer perfis com necessidades de comunicação diferentes para o tratamento de pacientes com autismo de autorrendimento, paralisia espástica etc. A licença é dada por tablet. Em uma instituição de ensino, por exemplo, um professor pode usar um aparelho para sua turma inteira. A escola Dia a Dia em Belo Horizonte utiliza o Livox e há clientes também nas cidades mineiras de Juiz de Fora e João Monlevade.
O Livox não está disponível no Google Play, porque, segundo seu criador, é um produto médico, em que é preciso o acompanhamento de profissionais para a sua utilização. Os especialistas avaliam se é preciso um acionador ou um tablet com tela maior. “Muita gente acha que é brincadeira. Acredita que é só jogar na mão da pessoa e ela já sai falando. É preciso um trabalho com fonoaudióloga e com um terapeuta ocupacional. O pai não sabe se o filho vai entender o desenho de uma maçã. Pode ser que ele compreenda somente a foto”, justifica. Quando há interesse em adquirir o aplicativo, a pessoa deve entrar em contato por meio do site.
Do papel ao touch
Em 1985, dois norte-americanos, da empresa Pyramid, Andy Bond e Lori Frost, criaram o Picture Exchange Communication System (pecs.com), mais conhecido como PECS, que é um sistema de comunicação por troca de figura. O modelo promove a comunicação aumentativa (para aqueles que têm alguma dificuldade) ou alternativa (para aqueles que não falam). O PECS ensina o indivíduo a dar uma figura de um item desejado para um parceiro de comunicação. O sistema é dividido em seis fases, com objetivos cada vez mais desafiadores à medida que se passa de uma para outra. Nas fases mais avançadas, os indivíduos são ensinados a responder a perguntas e fazer comentários.
No ano passado, a fonoaudióloga Soraia Cunha Peixoto Vieira, de 37 anos, trouxe o método para o Brasil e abriu a sede da diretoria geral da Pyramid em Belo Horizonte (MG). Ela trabalhou 12 anos com o PECS na Inglaterra. Vieira conta que, nas fases 1 e 2, a pessoa estuda o método e aprende que precisa escolher uma figura e entregá-la ao seu interlocutor. Já na 3, ela discrimina a figura. É para esse ponto que foi criado o aplicativo do PECS para iPad (http://bit.ly/14gLxm4). Há usuários de 18 meses a 83 anos de idade. O app permite incluir novas figuras no banco e tem opção de gravar voz.
Outro aplicativo da Pyramid disponível é o Working4 (http://bit.ly/1b9sOKW), com tradução para o português e custo de US$ 2,99. Com ele, é possível reforçar comportamentos positivos – para ter um pedido atendido é preciso fazer tarefas específicas discriminadas no programa.
Na fase 4, o PECS ensina a formar frases juntando duas figuras: “Eu quero” e “comer”, por exemplo. Na 5, o usuário responde a perguntas e na 6 ele faz comentários sobre o cotidiano. A equipe já trabalha para criar aplicativos para as próximas fases, mas ainda não há previsão do lançamento.
Vieira acredita que é importante fazer um treinamento do método para tirar total proveito do PECS, especialmente os pais, para poderem usar com os filhos em todos os lugares. “O método é o mesmo para todo mundo, mas cada um vai evoluir do seu jeito”, ressalva.
Empresa brasileira desenvolve aplicativos para portadores de distúrbios de linguagem e articulação
Blogueira testa e reprova programas disponíveis para o sistema Android
Se
antes era preciso dar prêmios para as crianças participarem ativamente
de uma terapia com uma fonoaudióloga, hoje basta mostrar a elas os
tablets e a mágica está feita. É o que assegura a brasileira Bárbara
Fernandes, de 30 anos, fundadora e diretora da Smarty Ears
(ipadfono.com), empresa que cria aplicativos para psicopedagogia e
fonoaudiologia. Fernandes foi a primeira fonoaudióloga nos Estados
Unidos a propor o uso de dispositivos móveis para crianças com
distúrbios de linguagem e articulação. A empresa foi fundada em 2009 e
hoje tem mais de 60 apps em inglês e 11 em português, com planos de
expansão.
“Tenho visto uma mudança radical na aprendizagem das crianças desde que os tablets começaram a ser utilizados para o ensino. Pela primeira vez, elas estão fascinadas para passar por uma sessão com a fonoaudióloga”, ressalta. Segundo ela, os pais também começaram a participar mais ativamente no aprendizado porque, enfim, têm uma ferramenta em casa (smartphone ou tablet) que pode ser utilizada. Crianças que se comunicaram pela primeira vez com a mãe usando um iPad como voz e um idoso que era médico e teve melhoradas as habilidades perdidas depois de um derrame são alguns exemplos dos benefícios potenciais dos programas em dispositivos móveis.
Para a diretora, existe uma diferença muito grande entre aplicativos que são desenvolvidos por pessoas leigas e profissionais da educação. Ela conta que sempre foi fascinada por tecnologia e já usava o computador com seus pacientes frequentemente. Quando o iPhone foi lançado, em 2007, ela viu que não havia aplicativos para a plataforma e decidiu criá-los. “Meus 10 anos como fonoaudióloga me dão experiência e conhecimento para saber qual a melhor forma de avaliar o aprendizado usando dispositivos móveis”, conta.
A equipe da Smarty Ears é formada por 20
fonoaudiólogos e professores de educação regular e especial. Durante o
desenvolvimento do app, pais de meninos com deficiência, programadores e
ilustradores também entram em cena. Isso possibilita criar aplicativos
em várias áreas: pessoas que sofrem de gagueira, idosos que sofreram
derrame e têm dificuldade de leitura e escrita, crianças em treinamento
de pronúncia e outros, como os autistas, para a melhora de habilidades
de comunicação.
Entre os aplicativos mais populares no Brasil, está o Academia da Articulação para crianças, além do recém-lançado Afasia-Pro, destinado a adultos com afasia (distúrbio na formulação e compreensão da linguagem). Os dois podem ser baixados por familiares para o treinamento em casa. A maior parte dos aplicativos é paga, mas tem valor bem abaixo dos softwares para computador. “No Brasil, programas para fonoaudiologia e para crianças com deficiência sempre foram muito caros e ainda são. Quando fizemos a pesquisa, eles custavam cerca de R$ 200. Os nossos são, em média, R$ 20”, ressalva Fernandes.
MOBILIDADE
Os aparelhos móveis são o foco da atenção da empresa justamente por serem portáteis e também intuitivos, facilitando o aprendizado em qualquer lugar: no carro, em casa ou na escola. Todos os programas criados são exclusivos para a plataforma iOS, porque, segundo a diretora, o iPad tem sido estudado por vários profissionais nos Estados Unidos e têm se mostrado o tablet que alcançou o maior sucesso entre crianças com deficiência. “O sistema iOS é o mais fácil a ser utilizado e é muito intuitivo – o que é fundamental para pessoas que já têm tanta dificuldade. Os aparelhos Android estão começando a dar sinal que podem um dia competir nessa área, mas, na minha opinião, ainda deixam muito a desejar”, justifica Fernandes.
Prova dos nove
No ano passado, a jornalista e fã de tecnologia Cler Oliveira, de 37 anos, foi procurada pelo amigo Fernando, que então tinha se tornado deficiente visual, para lhe dar uma mãozinha com o tablet que havia ganhado da namorada. Ele precisava de um leitor de tela para usar o aparelho. Cler procurou e a primeira opção que achou era muito cara, cerca de R$ 200. Mesmo assim, baixou a versão de demonstração e, vendada, testou o aparelho. A surpresa foi grande quando ela percebeu que era impossível realizar atos básicos de maneira simples com a plataforma. Descobriu então um segundo programa, o Lis, que, apesar da necessidade de conhecimento em braile, seria uma alternativa.
Vitimado por um câncer, Fernando não chegou a conhecer o software. Desde então, a jornalista resolveu fazer dos testes dos aplicativos um blog com dicas e curiosidades para poder ajudar um número maior de pessoas. Criado em janeiro, o Aplicativos para pessoas com deficiência (aplicativosparapcd.com) tem cerca de 300 visitas diárias e foi criado em janeiro. “Segundo o último censo, há 45 milhões de pessoas com deficiência no Brasil. Esse público consome tecnologia. Os desenvolvedores têm que ter um cuidado maior para criar programas para ele”, diz Oliveira. Uma amiga de Cler, que é deficiente visual, volta e meia, descobre erros de digitação com um aplicativo de audiodescrição com que confere o conteúdo do blog.
Para ela, o grande problema é que, normalmente, os programas não dão autonomia total aos usuários com deficiência. É preciso que outra pessoa intervenha, que baixe e abra o app. Cler diz preferir o sistema operacional iOS por ter melhores configurações de acessibilidade embarcadas no dispositivos. “O programa da Apple guia você. Eu testei de olhos fechados e falei: meu Deus, quero um para mim”, conta. Já aplicativos Android, para tornarem o aparelho mais acessível, como o Talkback, precisam evoluir. A jornalista tem o hábito de enviar e-mails aos desenvolvedores com dúvidas diversas, mas são raros os casos em que têm retorno.
Cler, que tem também outros dois blogs, diz que o Aplicativos é o seu xodó. É o único que conta com recursos de acessibilidade 2.0. Entre as ferramentas que já testou, o PDF to Speech, que permite ouvir gravação sonora de arquivos em PDF, é o que ela julga o mais completo. “Ando muito de ônibus e me canso de ler. Aí coloco o fone e vou ouvindo o livro”, diz. O Call anouncer diz o nome da pessoa e número que está ligando no seu smartphone. Segundo ela, os mais baixados são sempre as pranchas de comunicação alternativa. “Já testei vários aplicativos e alguns não prestaram para nada. Tinha um de localização, que, se o seguisse, estaria perdida”, lembra.
'Tenho visto uma mudança radical na aprendizagem das crianças desde que os tablets começaram a ser utilizados para o ensino' - Bárbara Fernandes, diretora da Smarty Ears |
“Tenho visto uma mudança radical na aprendizagem das crianças desde que os tablets começaram a ser utilizados para o ensino. Pela primeira vez, elas estão fascinadas para passar por uma sessão com a fonoaudióloga”, ressalta. Segundo ela, os pais também começaram a participar mais ativamente no aprendizado porque, enfim, têm uma ferramenta em casa (smartphone ou tablet) que pode ser utilizada. Crianças que se comunicaram pela primeira vez com a mãe usando um iPad como voz e um idoso que era médico e teve melhoradas as habilidades perdidas depois de um derrame são alguns exemplos dos benefícios potenciais dos programas em dispositivos móveis.
Para a diretora, existe uma diferença muito grande entre aplicativos que são desenvolvidos por pessoas leigas e profissionais da educação. Ela conta que sempre foi fascinada por tecnologia e já usava o computador com seus pacientes frequentemente. Quando o iPhone foi lançado, em 2007, ela viu que não havia aplicativos para a plataforma e decidiu criá-los. “Meus 10 anos como fonoaudióloga me dão experiência e conhecimento para saber qual a melhor forma de avaliar o aprendizado usando dispositivos móveis”, conta.
Saiba mais...
Aplicativos para tablets ajudam pessoas com dificuldades de comunicação
Jeitinho brasileiro para a inovaçãoEntre os aplicativos mais populares no Brasil, está o Academia da Articulação para crianças, além do recém-lançado Afasia-Pro, destinado a adultos com afasia (distúrbio na formulação e compreensão da linguagem). Os dois podem ser baixados por familiares para o treinamento em casa. A maior parte dos aplicativos é paga, mas tem valor bem abaixo dos softwares para computador. “No Brasil, programas para fonoaudiologia e para crianças com deficiência sempre foram muito caros e ainda são. Quando fizemos a pesquisa, eles custavam cerca de R$ 200. Os nossos são, em média, R$ 20”, ressalva Fernandes.
MOBILIDADE
Os aparelhos móveis são o foco da atenção da empresa justamente por serem portáteis e também intuitivos, facilitando o aprendizado em qualquer lugar: no carro, em casa ou na escola. Todos os programas criados são exclusivos para a plataforma iOS, porque, segundo a diretora, o iPad tem sido estudado por vários profissionais nos Estados Unidos e têm se mostrado o tablet que alcançou o maior sucesso entre crianças com deficiência. “O sistema iOS é o mais fácil a ser utilizado e é muito intuitivo – o que é fundamental para pessoas que já têm tanta dificuldade. Os aparelhos Android estão começando a dar sinal que podem um dia competir nessa área, mas, na minha opinião, ainda deixam muito a desejar”, justifica Fernandes.
Clique para conhecer mais aplicativos que auxiliam a fala e articulação |
Prova dos nove
No ano passado, a jornalista e fã de tecnologia Cler Oliveira, de 37 anos, foi procurada pelo amigo Fernando, que então tinha se tornado deficiente visual, para lhe dar uma mãozinha com o tablet que havia ganhado da namorada. Ele precisava de um leitor de tela para usar o aparelho. Cler procurou e a primeira opção que achou era muito cara, cerca de R$ 200. Mesmo assim, baixou a versão de demonstração e, vendada, testou o aparelho. A surpresa foi grande quando ela percebeu que era impossível realizar atos básicos de maneira simples com a plataforma. Descobriu então um segundo programa, o Lis, que, apesar da necessidade de conhecimento em braile, seria uma alternativa.
Vitimado por um câncer, Fernando não chegou a conhecer o software. Desde então, a jornalista resolveu fazer dos testes dos aplicativos um blog com dicas e curiosidades para poder ajudar um número maior de pessoas. Criado em janeiro, o Aplicativos para pessoas com deficiência (aplicativosparapcd.com) tem cerca de 300 visitas diárias e foi criado em janeiro. “Segundo o último censo, há 45 milhões de pessoas com deficiência no Brasil. Esse público consome tecnologia. Os desenvolvedores têm que ter um cuidado maior para criar programas para ele”, diz Oliveira. Uma amiga de Cler, que é deficiente visual, volta e meia, descobre erros de digitação com um aplicativo de audiodescrição com que confere o conteúdo do blog.
Para ela, o grande problema é que, normalmente, os programas não dão autonomia total aos usuários com deficiência. É preciso que outra pessoa intervenha, que baixe e abra o app. Cler diz preferir o sistema operacional iOS por ter melhores configurações de acessibilidade embarcadas no dispositivos. “O programa da Apple guia você. Eu testei de olhos fechados e falei: meu Deus, quero um para mim”, conta. Já aplicativos Android, para tornarem o aparelho mais acessível, como o Talkback, precisam evoluir. A jornalista tem o hábito de enviar e-mails aos desenvolvedores com dúvidas diversas, mas são raros os casos em que têm retorno.
Cler, que tem também outros dois blogs, diz que o Aplicativos é o seu xodó. É o único que conta com recursos de acessibilidade 2.0. Entre as ferramentas que já testou, o PDF to Speech, que permite ouvir gravação sonora de arquivos em PDF, é o que ela julga o mais completo. “Ando muito de ônibus e me canso de ler. Aí coloco o fone e vou ouvindo o livro”, diz. O Call anouncer diz o nome da pessoa e número que está ligando no seu smartphone. Segundo ela, os mais baixados são sempre as pranchas de comunicação alternativa. “Já testei vários aplicativos e alguns não prestaram para nada. Tinha um de localização, que, se o seguisse, estaria perdida”, lembra.
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